sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Carta ao meu avô!


Querido Avô,
Grande parte da minha vida te ouvi falar sobre o eu não saber o que é passar necessidades como tu passaste, o que é trabalhar de sol a sol e chegar a casa e quase nada ter para comer. Muitas vezes te ouvi falar do que é não ter tido a oportunidade de estudar, das muitas oportunidades que nós temos e que não tiveste. E sempre que te ouvia falar nisso, pensava ou dizia-te que os tempos são outros, que muita coisa mudou.
Quando comecei a estudar e a conhecer a história do nosso país, comecei a perceber aquilo que passaste, mas sempre com fé no futuro de não ter que viver certas coisas.
Lembra-me da maneira como falavas de António de Oliveira Salazar, a mágoa que brilhava nos teus olhos e a dor que transparecia nas tuas palavras. E eu não gostava, porque sempre tive uma boa imagem desse mesmo homem, que honrava a Pátria, a Família e, acima de tudo, Deus.
Ainda navegam nas águas da minha memória as tuas palavras quando dizias que não sabia/sabíamos o que era ter vivido uma revolução e todas as melhorias que ela trouxe, para ti e para os teus, as oportunidades que nasceram e a mudança que se deu.
Entre ti e eu há a diferença de uma geração. Vivemos em épocas diferentes, com coisas que tu não tinhas na tua adolescência e juventude. Muitas vezes ainda pensas que algumas coisas são como há cinquenta anos atrás. Mas não, avô, muita coisa mudou.
Mas hoje, nos tempos que vivemos, posso dizer-te que nem tudo mudou.
Muito te ouvi dizer que Salazar dizia que livraria os portugueses da guerra, mas não da fome. E sabes uma coisa? Salazar morreu pobre e foi enterrado num pedacinho de terra no Vimieiro, onde muitos pisam essa terra e lha querem tirar. Mas o pobre homem deixou os cofres do Estado cheios de ouro (sempre o ouvi dizer). Hoje não temos um chefe de estado, um ditador, mas temos políticos que irão morrer ricos, para não dizer riquíssimos. E sabes uma coisa? Falcatruaram os seus estudos para poderem tirar mais uns trocos do nosso bolso.
Sabes, avô, os tempos que correm não são tempos fáceis. As pessoas voltaram a emigrar para conseguirem sobreviver. A cada dia que passa, mais medidas de austeridade são anunciadas e, o pobre do povinho, cada vez mais pobre e esses ladrões cada vez mais ricos. No teu tempo fugias da Pide, com medo da censura e de ires preso. Hoje não somos censurados, mas parece que ainda vivemos nesse tempo do lápis azul.
Hoje olho para o Parlamento com uma visão sarcástica. Parece uma cambada de miúdos, como no teu tempo, a atirarem pedras a um pobre pássaro sem nenhum pensar que forma seria melhor apanhá-lo.
Pois é, avô, parece que nem tudo melhorou, somente mudaram as circunstâncias e a forma de protestar. Já não cantamos a “Grândola vila morena” nas rádios para iniciar uma manifestação. Fazemo-lo pelas redes sociais. Mas a “Grândola” ainda por cá mora, de maneira diferente. Os corvos agora escrevem discursos mirabolantes para tentar tapar os nossos olhos, mas ainda alguém dorme ao relento na areia, ainda alguém passa fome, ainda alguém desespera e mete um fim à vida. Hoje as prisões não são de cimentos e pedra, mas muitos parecem viver em autênticas prisões.
Muitas vezes te disse que precisávamos cá do Salazar, e tu dizias que não sabia o que era viver no tempo dele. Hoje eu digo-te que precisamos de um Salazar moderno, de alguém que ponha fim a esta vergonha e coloque as nossas economias estáveis. Alguém que não se importe de morrer pobre desde que tenha ajudado o povo. Estes corvos, avô, não se interessam por cumprir as promessas; não se interessam por aqueles que votaram neles e que lhes dão a oportunidade de meter mais um pouco ao bolso. E todos nós somos burrinhos, porque voltamos a votar nos mesmos, sempre que há eleições. Os ladrões são todos os mesmos, só mudam de nome ou partido.
Hoje, avô, eu temo pelo meu futuro. Não sei se amanhã terei um emprego. Hoje eu temo pelos meus, não sei se amanhã terão um trabalho. Hoje eu temo pelos que hão-de vir, pois não sei em que terceiro ou quarto mundo irão viver. Tememos arriscar. Calamo-nos para não perdermos o que temos. Hoje eu vivo com medo de uma revolução, ou com a adrenalina de uma. Precisamos de mudar, mas poucos são os que apontam caminhos…
Ao fim de tudo, não sei, avô, se mudámos para melhor ou para pior.
Teu neto,




Ad majorem Dei gloriam!
Ismael Sousa

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