quarta-feira, 13 de abril de 2011

REI


«Havia dois homens na mesma cidade, um rico e o outro pobre. O rico possuía ovelhas e vacas em grande número. O pobre nada tinha senão uma ovelha, só uma pequena ovelha que ele havia comprado.
Ele a criara e ela cresceu com ele e com os seus filhos, comendo do seu pão, bebendo na sua taça, dormindo no seu colo: era como sua filha.
Um hóspede veio à casa do homem rico, que não quis tirar uma das suas ovelhas ou de suas vacas para servir ao viajante que o visitava.
Ele tomou a ovelha do homem pobre e a preparou para a sua visita.»
Esta é uma passagem do segundo livro de Samuel, onde o profeta Natã conta esta história ao rei David.
David vira uma mulher e apaixonara-se por ela. Averiguou sobre a sua vida e, mesmo sabendo que ela era casada, deitou-se com ela. Depois mandara o marido dormir com ela, mas este sabendo do que se sucedera, não o fizera. Então David mandou-o para a linha da frente de batalha, para que este morresse.
Bem, se quiserem a história mais pormenorizada, podem sempre pegar naquele livro com dois mil anos, procurar o segundo livro de Samuel e ler a partir do capítulo onze.
Mas, na verdade, eu transcrevi este texto, não para vos dar a conhecer mais um pouco da Bíblia, mas sim para vos dizer algumas palavras.
O que se passou com o rei David, naquela altura, passa-se hoje: o homem quer adquirir para si aquilo que não lhe pertence, que tem outro dono. E depois de o ter adquirido para si, restitui-o e tenta emendar o erro. Quando não consegue, tenta de tudo para o conseguir.
O homem é capaz de retirar ao outro aquilo que o outro mais gosta. Esse, que podemos considerar o homem rico, não se importa com os sentimentos dos outros: quer e nada mais. E aquele “objecto” (simbolizado pela ovelha) pode representar muito para o pobre. Mas isso não interessa, pois o homem rico tem que se concretizar a si mesmo, nem que para isso tenha de rebaixar quem está a seu lado.
Se um trabalho corre bem, logo alguém vem dizer que o trabalho foi feito por si, quando esse seria, quem sabe, o momento de glória daquele que se matou a trabalhar.
David converteu-se com as palavras do profeta Natã, mas os homens de hoje não se querem converter, pois eles é que têm nome.
O homem por vezes torna-se invisível.
Ninguém o vê, ninguém o ouve.
Mas este mesmo homem continua com o seu trabalho, independentemente do reconhecimento. O homem serve: não para ser reconhecido, mas sim para estar à disposição de todo aquele que necessitar. E por vezes mais vale perdurar na sombra, do que surgir nas luzes da ribalta, ser reconhecido e ter fama.
A fama leva à morte. Leva à morte daquilo que o homem é verdadeiramente. Leva à morte da sua liberdade.
O homem torna-se um ser condicionado, em que tem de agir de certa forma, pensar de forma igual. Resumindo: o homem torna-se um autêntico robô.
Mas aqueles que perduram na sombra, são mais felizes. A sua liberdade não é contestada, a sua opinião não é criticada. O homem da sombra, sente; o homem da sombra ama; o homem da sombra sofre. Mas na sua sombra ele permanece, sem que ninguém se preocupe com ele.
Mas a pouco e pouco, ele aprende a viver nesta sombra, a conviver diariamente.



Ad majorem Dei gloriam!
Ismael Sousa

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