segunda-feira, 18 de outubro de 2010

De olhos no infinito!

Vejo-te sentada, na solidão da noite fria.
A minha cabeça dá mil voltas para tentar perceber o porquê de estares ali tão só!
A idade passou, e as tuas mãos foram envelhecendo com o árduo trabalho de sol a sol! A tua pele foi ganhando altos e baixos pelas preocupações dia-a-dia! Nunca mais sentistes alegria na tua vida. Nem filhos nem netos tivestes. A saudade foi a tua companheira durante anos.
De entre as contas do rosário ias derramando lágrimas de saudade, dor, solidão...
A teu lado nunca tivestes ninguém que te ouvisse, e quando o tivestes, partiu cedo.
Trabalhastes a tua vida toda para teres algum pão para comer...
Muitas noites ficastes sem comer, e alguns dias também...
Resististes a tempestades e ventanias... Nunca deixastes a tua pobre casa...
Decorada com papel de parede da cor da alegria e da tristeza lado a lado.
Agora já não podes trabalhar mais, e vives do pouco que tens...
Vejo-te muitas vezes no banco de um jardim, esperando que a fome que sentes passe, e que a morte venha...
Já não tens mais razões para viver. Tudo o que tinhas te tiraram...
Toda a tua vida vivestes para os outros, sem nunca nada pedires em troca, a não ser a atenção daqueles que tu amavas. Que tu ainda amas... Que tu nunca deixarás de amar...
Nunca te preocupastes contigo mesmo, vivendo para os outros. Hoje estás só.
Questionaste muitas vezes se terá valido a pena todo o sofrimento, todo o bem que fizestes ao outros; se valeu a pena, não o sabes, pois a única certeza que tens é que agora estás sozinha.
Raras vezes recebestes um louvor, e quando o recebestes não o aceitastes.
Olhas o infinito e sabes que um dia, quando os teus olhos se fecharem eternamente, não mais serás recordada.
Ao teu funeral aparecerá só o padre, e ninguém se lembrará que ali está uma criatura de Deus, que toda a sua vida viveu para os outros.
Prevês o dia da tua morte, esperando que ela venha durante o sono... Anseias por essa vinda há muito tempo...
Rezas uma última vez, vestes a tua melhor roupa e deitas-te.
Despedes-te de tudo à tua volta e fechas os olhos.
Adormeces esperando a morte que virá esta noite.
A tua pele queimada pelo sol gela. A cor da tua pele esbranquiça... A tua alma dirige-se para a Luz Celeste.


Ismael Sousa

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